Daniel
Colaboração para o VivaBem
15/01/2020 04h00
Se você pratica atividades físicas que exigem principalmente força e explosão, como musculação ou corrida de curta distância, a creatina é um dos suplementos que vale a pena tomar para ter melhor desempenho no exercício.
Porém, como boa parte das substâncias consumidas por atletas para aumentar a performance, ela ainda gera muitas dúvida e é cercada de mitos. A seguir, explicamos melhor o que é a creatina, quando tomar e como ela pode ajudar você a obter melhores resultados no exercício.
O que é?
A creatina é um composto produzido pelo fígado, rins e pâncreas, a partir de alguns aminoácidos (glicina, arginina, metionina). A substância também está naturalmente presente em carnes, peixes, frango, ovo, frutos do mar, leite e derivados. Em nosso organismo, ela é armazenada em grande parte no musculoesquelético e, em menor quantidade, no coração, músculos lisos, cérebro e testículos. Em geral, nosso corpo produz cerca de 1 grama de creatina por dia e outro 1 grama é ingerido na dieta
Para que a creatina é indicada?
O suplemento é recomendado para o aumento da força, da potência e da massa muscular (hipertrofia). A substância traz esses ganhos para o treino (quando aliada a uma boa dieta e um programa de exercícios adequado, é óbvio) por estar envolvida na produção de ATP, fonte de energia usada pelos músculos em exercícios predominantemente anaeróbicos (de alta intensidade e curta duração), como musculação, saltos, arremessos de peso e corridas muito curtas.
É importante saber que consumir a creatina não aumenta a massa muscular (é preciso malhar para conseguir isso). Basicamente, o que o suplemento faz é elevar a tolerância do atleta ao esforço e retardar a fadiga, permitindo que ele use cargas maiores e tenha um melhor desempenho nos exercícios — o que consequentemente vai gerar ganhos maiores. Além disso, por ser armazenada nos músculos juntamente com a água, a substância leva a um aumento do volume muscular.
Como tomar creatina
Grande parte dos suplementos de creatina é em pó, com ou sem sabor. A recomendação é que a substância seja diluída em água ou bebida de preferência de quem irá consumi-la (suco, leite, vitamina etc.), conforme orientação do nutricionista. Uma dica muito comum é misturar o suplemento a uma bebida com carboidrato (suco ou bebidas esportivas). Estudo publicado no Journal of Exercise Physology, da Sociedade Americana de Fisiologistas do Exercício, aponta que o consumo de creatina com glicose (açúcar) aumenta seu acúmulo nos músculos, quando comparado ao uso de creatina misturado com água.
Quanto devo consumir
De acordo com a regulamentação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária), uma dose do suplemento deve fornecer de 1,5 gramas a 3 gramas de creatina. Existem diferentes estratégias para se administrar a substância e muitas delas, inclusive, levam em conta o momento de treino do atleta (se é um período próximo da competição ou fase com exercícios mais intensos, por exemplo), daí a importância da orientação de um nutricionista e de um profissional de educação física (que saberá das capacidades físicas que serão mais exigidas naquele momento específico da prática esportiva).
Uma estratégia muito comum envolve o consumo de altas doses (20 g a 30 g de creatina por dia) durante cinco a sete dias (é o chamado loading) — para aumentar rapidamente a concentração da substância nos músculos –, seguido do consumo de doses menores (5 g por dia) durante três meses (fase de manutenção, ou seja, para manter o nível do composto no organismo). Depois, é indicada a interrupção do suplemento por cerca de um mês (fase de descanso), para que o corpo não se adapte à substância.
Já para os atletas que não necessitam de rapidez na “carga” de creatina, pode ser recomendada a ingestão de 3 g do suplemento ao dia, por três meses ou mais — em longo prazo (após cerca de 28 dias), essa estratégia vai proporcionar aumento do nível da substância semelhante ao obtido com a estratégia de loading e manutenção.
Também existem protocolos que sugerem a dose diária de creatina conforme o peso corporal do atleta ou sua faixa etária, daí a importância de procurar um nutricionista para avaliar individualmente a quantidade e o tempo de suplementação.
É melhor tomar antes ou depois do treino?
Pesquisas mostram que o momento do dia que o suplemento é ingerido não faz tanta diferença na performance durante o exercício ou na recuperação após a atividade. Os benefícios do consumo da creatina são obtidos graças ao aumento do nível da substância nos músculos, o que ocorre com a ingestão regular e não imediata.
Tem efeitos colaterais? Quem não pode tomar?
Algumas pessoas podem sofrer problemas gastrointestinais como diarreia, dor de estômago e náuseas ao consumir a creatina. Cãibras também são relatadas.
Crianças e gestantes não devem ingerir o suplemento. Já pessoas com problemas de saúde específicos e idosos devem verificar com um médico se podem utilizar a substância.
Quais os perigos do excesso de creatina?
É de extrema importância ter orientação nutricional e não ultrapassar a dosagem recomendada de qualquer suplemento. No caso da creatina, alguns especialistas alertam que o consumo excessivo (leia mais de 30 gramas por dia), em longo prazo, pode levar a disfunções no fígado, nos rins e até a alterações no ritmo cardíaco, apesar de os estudos sobre isso serem limitados e inconclusivos. De qualquer forma, é mais seguro evitar o exagero, até porque ele não traz benefícios à performance.
Creatina engorda ou faz inchar?
A substância não aumenta a quantidade de gordura corporal, porém, pode levar, sim, a um ganho de peso. Primeiro porque, com o treino regular, dieta adequada e uso da substância, seus músculos vão crescer (e músculo pesa). E segundo porque com o aumento do nível de creatina nos músculos também há uma elevação da quantidade de água dentro deles — e essa água não só pesa como aumenta o volume muscular (incha). “Mas isso não quer dizer que o suplemento vai fazer o indivíduo engordar ou ficar inchado no sentido mais lato da palavra”, explica Hamilton Roschel, coordenador do grupo de pesquisa em fisiologia aplicada e nutrição da USP (Universidade de São Paulo).
A creatina prejudica os rins
Como já falamos, a ingestão regular da substância com orientação nutricional e/ou médica é segura. No entanto, especialistas defendem que a ingestão excessiva e por longos períodos do suplemento eleva a concentração de creatinina na urina, podendo causar um comprometimento dos rins. Por isso, só use a substância com orientação profissional.
Creatina melhora o desempenho na corrida de rua?
Não. Corridas de longa distância, como as realizadas na rua, são atividades predominantemente aeróbicas e a cretina aumenta o desempenho em esportes que exigem força e potência (atividades anaeróbicas). Além de não trazer benefícios para a performance, a creatina pode até prejudicar o seu desempenho na corrida. Motivo: em corridas de longa distância, quanto mais leve o atleta melhor tende a ser seu rendimento e a creatina favorece o ganho de peso (devido ao acúmulo de água e aumento da massa muscular). Já corredores de prova em pista (100 m e 200 m rasos, por exemplo), podem se beneficiar do uso de creatina, pois força e potência são essenciais nessas competições.
Posso tomar creatina junto com cafeína?
Essa questão ainda é controversa e faltam trabalhos científicos de relevância para responder a questão. Alguns pesquisadores defendem que a combinação é prejudicial, pois a cafeína prejudica os efeitos ergogênicos (aumento de força e massa muscular) da creatina. Como isso aconteceria? A cafeína tem efeito diurético — ou seja, estimula seu organismo a eliminar água — e, como já explicamos, a creatina é armazenada nos músculos juntamente com água. Então, ao perder essa água você vai perder também a creatina.
Porém, outros cientistas consideram que após a carga de creatina (loading) a cafeína não afeta tanto o nível da substância nos músculos. Além disso, substâncias diuréticas estão presentes no nosso dia a dia (no café, no chá verde e até na cerveja) e não só no suplemento de cafeína. Na dúvida, o ideal é sempre se consultar com um nutricionista para saber qual estratégia é melhor para você em cada fase de treinamento.
Fontes: Hamilton Roschel, coordenador do grupo de pesquisa em fisiologia aplicada e nutrição da USP (Universidade de São Paulo).Audrey Yule Coqueiro, nutricionista e pesquisadora em ciência dos alimentos na Faculdade de Ciências Farmacêuticas da USP (Universidade de São Paulo); Alan Tiago Scaglione, nutricionista da Estima Nutrição, em São Paulo, e especialista em suplementação nutricional aplicada ao exercício pela USP; Ana Paula Hayashi, nutricionista na Pulse Medicina Esportiva Integrada, em São Paulo e especialista em obesidade, emagrecimento e saúde pela Unifesp (Universidade Federal de São Paulo); Renato Zilli, endocrinologista do Hospital Sírio Libanês, em São Paulo; Eliane Paiva, professora de nutrição da Unisuam, no Rio de Janeiro, e pós-graduada em segurança alimentar e qualidade nutricional pelo IFRJ (Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia); e Paola Machado, fisiologista do exercício, mestre em ciências da saúde e doutoranda em nutrição pela Unifesp e colunista do VivaBem.
Errata: o texto foi atualizado
O último intertítulo do texto repetia a palavra “cafeína”. Na verdade, a reportagem responde a pergunta “Posso tomar creatina junto com cafeína?”
https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/01/15/creatina-o-que-e-quando-tomar-e-quais-os-beneficios-para-o-treino.htm